Rota das Pretensões
O som dolente do aboio, um tanto quanto mourisco, sinalizava a abertura das veredas dos Sertões de Dentro, ali a ousadia vencia o medo em nome do desejo do déspota lusitano em manter distante dos canaviais à atividade pecuarista. Abrir novos caminhos era preciso, levar a palavra de Deus era necessário e lançar a sorte ao desconhecido era mais uma pretensão. Assim, fizeram os curraleiros de contrato, rasgando as matas de juremas e macambiras em busca das planícies aluviais para fartar a boiada de capim mimoso. Homens que lavaram suas honras com sangue de outros, tomando suas terras e fincando os mourões dos robustos currais da senhorial Casa da Torre.
As terras ditas de dentro, foram conquistadas por Domingos Afonso, de alcunha Sertão, sertão piauiense, o lugar escolhido para a construção das opulentas fazendas de gado vacum. Se este fazendeiro por aqui morou, esta estadia foi breve, uma vez que era comum tais fazendas serem abseteístas. Logo ele, fidalgo de “sangue limpo” e cavaleiro da Ordem de Cristo, morar nos Sertões de Dentro era privar-se das comodidades da capital da Colônia. Mafrense, um dos baluartes da colonização do Piauí, como qualquer homem de seu tempo esteve dividido entre a fé e o poder material, mas fustigado pelas origens religiosas tentou escapar em vida de arder no inferno pelas suas transgressões terrenas, assim, o seu suntuoso legado foi destinado aos clérigos da Companhia de Jesus, que em troca das muitas exigências deveria celebrar no dia de seu falecimento 150 missas em cada uma das igrejas soteropolitanas.
De posse do testamento, pretensiosamente, não tardou os jesuítas se fazerem presentes em terras piauienses, vieram apossar-se do que lhes eram por direito, assim, entre orações e a gerência das fazendas, campearam pelo Vale do Canindé. Muitos foram os Pai-Nossos e Ave-Marias que se fundiram ao barulho das palhas dos imensos carnaubais e muitos foram os tesouros escondidos por esses padres sob frondosas arvores, protegendo da ganância da Coroa Portuguesa, que outrora os expulsaram das terras brasileiras nos idos coloniais.
Seguindo a rota das pretensões, aos rincões do Piauí foi enviado pelo prelado pernambucano, o padre visitador Miguel de Carvalho, que fez da paisagem dessa terra um minucioso relatório descritivo, que resultou na edificação da ermida em devoção a Nossa Senhora da Vitória. Sem dúvida, a pretensão clerical de expandir a fé em Cristo pelos mais distantes lugares. Uma vez freguesia, logo foi designada a condição vila pela vontade do El-Rei e recebeu significativo número de degredados portugueses que não tardaram a se tornarem abastados senhores de gado. Homens e mulheres base genealógica de muitas gerações, de muitas famílias e de muitas histórias que ainda são contadas nos alpendres de velhas fazendas que resistem à força do tempo.
Pretensão do Visconde da Parnaíba, nobre togado pela Casa imperial, que se tornou o mais notável piauiense de seu tempo, sobre ele derramou-se o preito dos conservadores e liberais, pela sua habilidade administrativa. Assim, emplacou vinte anos de governo provincial, onde tiranamente fez de seus desejos as suas próprias leis, tornando-se inquestionável príncipe da Francia do Piauí.
Pela rota das pretensões ficaram apenas as lembranças dos dias sem datas; da boiada rumo às feiras das cidades baianas, dos padres catequistas, dos mercadores andantes, de vaqueiros que tentavam a sorte no solo mais ríspido do Brasil, mas que mesmo assim resistiam com bravura. Nessas veredas sentimentais eis a pretensão maior, o próprio Piauí, território delimitado pela ousadia e pela persistência de quem um dia o escolheu para morar.
Junior Vianna
Um comentário:
oi Junior, olha eu gostei muito do teu blog, confesso que não fiquei muito tempo pois hj estou fazendo campanha
estou na final do VI eu tenho um blog da comunidade eu tenho um blog no orkut, se achar que mereço seu voto, me sentirei muito grato ^^
Estou concorrendo na categoria LITERATURA. Abraçus
depois volto com mais calma
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